2.2.14

... que os barcos voltem a subir o Guadiana... valeu a pena?


O FUGITIVO


"An harbour shall be that is to found and-oh! 
Ever again-conquered"


Um homem corre na noite
é uma imagem banal
podia ser em Madrid
ou Johanesburgo,
ou em S. Paulo
ou Budapeste, Nova Yorque
ou Hollywood
ou é claro em Portugal
um homem corre na noite
é uma imagem banal
Porque foge? De onde vem?
porque olha para tráz inquieto?
Será soldado? vagabundo?
criminoso? ratoneiro?
será apenas o primeiro?
dos que vão fugir com eles?
Foge p'ra salvar a pele
só a sua? a pele dos outros?
a pele clara ou escura?
quanto tempo vai durar a sua fuga?
quanto dura? o que espera?
o que espera o homem --fera?
se chegar a quem o espera?
alguém o quer?alguém se acende?
alguém o chora?
alguém por quem ele chorou
chorará por ele agora?
alguém que nunca o traírá
e se sim., onde será?
Um homem luta contra o sangue
que derrama
e diz: faleu a pena?

Que os barcos
voltem a subir o Guadiana
vindos de longe
do mar

Que os barcos
voltem a subir o Guadiana
descarregando à passagem
do o trigo
que o cavalo esbaforido
chegue à relva, sua cama
que o fugitivo
encontre o seu porto de abrigo

Um homem corre na noite
é uma imagem banal
esgueirando de holofotes
com a estrada que atravessa
se confunde
com o seu breu do seu corpo
se confunde
e se passa um muro branco
fica branco como o cal
tal e qual
o camaleão
é uma imagem banal

Um homem luta contra o sangue
que derrama
em que cama
terá ele o seu repouso?
está ancioso? e como não?
não estaria quem pisasse
um desconhecido chão?
Não estaria de garganta afogueda
quem por nada
assim fugisse?
quem por tudo suplicasse
dai-me forces, dá-te forces
a ti próprio te confias
dá-te alento. dá-te tempo
dá-te dias
sobrevive de agonies
respirando sobrevives
sobrevive
Um homem vive
contra o sangue
que derrama
e diz: valeu a pena?
Que os barcos
voltem a subir o Guadiana
descarregando à passagem
do o trigo
que o cavalo esbaforido
chegue à relva, sua cama
que o fugitivo
encontre o seu porto de abrigo

Um homem corre na noite
é uma imagem banal
porque insiste? porque teima?
não há pânico na rua
não há fogo no quintal
labaredas? só nas camas
dos amantes
já distantes
chegam ruídos, utopias
quanto vale uma utopia?
vale tudo? quanto vale?
um homem corre na noite
é uma imagem banal
o que fez o fugitivo?
se está vivo é porque more
se morrer é porque o matam
se o matarem sera justo?
inocentes são os culpados de outros crimes
de que culpa?
de paixão? de inconsciência?
será justo ou não sera
desbaratar a inocência
tão a custo conquista?
porque corre o fugitivo nessa estrada?

E agora para para agora
o homem para
para agora para agora
será que sente que chegou a sua hora?

É impossível
Não é possível
correr tanto
e pensar tão
lucidamente
o coração
não aguenta
a cabeça também não
porque tenta
ultrapassar os seus limites?
provavelmente
é por vontade de viver
(quente quente...)
que ultrapassa os seus limites

diz para o seu coração

sentes que valeu a pena?
se te obrigam a fugir
mais te obrigam
a chegar junto a ti
valeu a pena?

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